Estudo aponta que 30% dos brasileiros que pedalam ganham entre um e dois salários mínimos. Na Baixada, vira até bazar
Rio
- Cotonete, esponja, pregador, abridor de lata, de garrafa, faca de
cozinha ou tesoura. O freguês pode escolher à vontade, porque o mascate
Jorge Carlos do Nascimento oferece isso tudo no seu bazar de duas rodas,
que ainda comporta o Jeremias, de 1 ano e 8 meses, e a Sarah, de 5
anos. Ele não tem certeza da idade — é algo entre 55 e 60 anos — e sabe
muito menos quando se equilibrou pela primeira vez sobre uma bicicleta.
Mas tem plena consciência de que sem ela, não poderia arcar com as
despesas de casa. “Não posso carregar peso, não posso trabalhar em obra e
nem fazer limpeza, mas tenho que dar comida para eles e viver”, diz
apontando as crianças que ouvem tudo com atenção. “E a bicicleta ajuda”,
garante Nascimento, antes de dar uma tossida e seguir em frente.
O
Perfil do Ciclista brasileiro, pesquisa realizada pelo Observatório das
Metrópoles, Programa de Pós-Graduação em Urbanismo (PROURB/UFRJ) e pela
ONG Transporte Ativo, em parceria com outras nove organizações que
atuam na promoção da bicicleta, revela que 30% dos brasileiros que
pedalam ganham entre um e dois salários mínimos, como o Nascimento. “A
bicicleta é o meio de transporte dos trabalhadores”, crava sem medo de
errar o pesquisador Juciano Rodrigues, do Observatório das Metrópoles,
um dos coordenadores do estudo. E é mesmo. Basta olhar o estacionamento
das fábricas ou dar uma passadinha por um dos bicicletários que a
Supervia construiu ao lado de seis estações de trens da Baixada
Fluminense e Zona Oeste do Rio, para conferir a quantidade de
bicicletas.
Além das características do ciclista, a pesquisa
quis saber o que motiva as pessoas a optar pela bicicleta. Questões como
rapidez e praticidade, saúde e custo despontam como as principais
razões. “É o meio de transporte completo, que ainda tem a vantagem de
não ser poluente e ocupar pouco espaço”, reforça o pesquisador
Rodrigues. A Pesquisa ouviu 5012 ciclistas, de dez cidades das
diferentes regiões brasileiras. Aqui no Rio de Janeiro, por exemplo,
34,8% dos ciclistas utiliza a bicicleta em combinação com outro modo de
transporte, seja para trabalhar, estudar ou fazer compras.
A
bicicleta é o principal meio de transporte utilizado pelos passageiros
da Baixada Fluminense e da Zona Oeste para chegar às estações de trem da
Região Metropolitana do estado. O ramal Japeri lidera o ranking, sendo
representado por 58% de passageiros”, segundo a Supervia. No entanto,
nem tudo é perfeito nesse universo. A pesquisa indica que para os
cariocas a insegurança e a falta de educação no trânsito são os
principais problema enfrentados pelos ciclistas na cidade. Eles reclamam
dos motoristas e pedestres que não respeitam a bicicleta. Entretanto,
quem está na rua vê que muitos ciclistas, apesar de vestirem o uniforme
do politicamente correto, também violam regras básicas, como trafegar no
sentido certo das ruas e parar nos sinais vermelhos. “O comportamento
do ciclista será objeto de outra pesquisa”, adianta Rodrigues, afirmando
que as batalhas no trânsito “são conflitos da sociedade,independente do
transporte que o cidadão utiliza”.
Os pesquisadores acreditam que
o estudo fornece subsídios para que gestores públicos e urbanistas,
entre outros envolvidos, formulem uma agenda mais precisa e robusta de
políticas públicas e ações de promoção do transporte cicloviário. Apesar
de todas as vantagens do uso da bicicleta na comparação com o carro, a
produção nacional caiu 10% no ano passando, chegando a 3,6 milhões. As
vendas também apresentaram queda de 10%, alcançando os 3,3 milhões de
unidades, de acordo com dados divulgados pela Associação Brasileira dos
Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e
Similares (Abraciclo).
Existem várias teorias sobre a invenção
e o desenvolvimento da bicicleta como veículo de transporte. Diz-se até
que foi coisa do genial italiano Leonardo da Vinci, mas não há
comprovação científica de nada. O inventor não patenteou sua criação. Se
desconhecemos o passado, o futuro também se apresenta como um mistério,
já que a quantidade de bicicletas elétricas ou motorizadas que circulam
na cidade é um indício de que pedalar mesmo pode estar com os dias
contados. Além de novas tecnologias, as preocupações ambientais também
devem influenciar a produção de novas alternativas para as duas rodas.
Mas, afinal onde vai parar a bicicleta? Talvez na porta de sua casa, com
o Nascimento, a Sarah e o Jeremias oferecendo cotonete, esponja,
pregador, abridor de lata...
ANDRÉ LUÍS GOMES, CASADO, 35
Chama
sua bicicleta, que tem um dos pedais quebrados, de ‘Caidinha’. “Levo 15
minutos até minha casa. Se fosse de ônibus seria uma hora. Só o tempo
que a gente espera a condução passar já desanima. Ando com ela todos os
dias. O Fusca fica na garagem”.
ANA CLÁUDIA E ÍRIA DE OLIVEIRA
Deixam suas bicicletas guardadas em uma estação da Baixada Fluminense e
pegam o trem para trabalhar. Ana aprendeu a andar há dois anos e
valoriza a atividade física. Íria pedala desde criança. Acha prazeroso,
mas teme a violência no trânsito.
DALILA MIRANDA, SECRETÁRIA
Mora
em Paracambi e vai de trem até Engenheiro Pedreira, onde a bicicleta
fica guardada. “Os ônibus demoram muito a passar. De bicicleta, levo 15
minutos até o escritório”, conta Dalila, que pedala de segunda a
sexta-feira e folga as pernas no fim de semana.
BICICLETÁRIOS DA SUPERVIA
Integrados
ao sistema de trens, oferecem quatro mil vagas para os ciclistas. No
espaço tem oficina para pequenos reparos, bombas de ar para calibragem
de pneus e bebedouros. Quem não é usuário do sistema ferroviário, paga
diária de R$1.
Números da pesquisa
- 42,9% optam pela rapidez e praticidade
- 50% atribuem à infraestrutura cicloviária a motivação para pedalar
- 88,01% usam a bicicleta para ir ao trabalho
- 34,6% reclamam da falta de educação no trânsito
- 50% atribuem à infraestrutura cicloviária a motivação para pedalar
- 88,01% usam a bicicleta para ir ao trabalho
- 34,6% reclamam da falta de educação no trânsito
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