Por Márcia Pontes
No Brasil estamos acostumados a sermos avaliados pelo sistema de notas que vão de zero a 10. “Tirar 10” é o sonho de todo mundo. Uma nota 9 ainda vai lá. Tirou 8 já começa a ficar preocupado com o próprio desempenho. Mas, e quando a maior parte das notas é 6 e a mais alta é 7?
Infelizmente, são essas as notas atribuídas ao Brasil em quatro quesitos pelo sistema de avaliação da ONU no Relatório Global para a Década referente ao ano de 2013. São eles: fiscalização para limite de velocidade, legislação nacional por dirigir embriagado, lei nacional para o uso do cinto de segurança e legislação nacional para segurança das crianças no trânsito (em todos fomos avaliados com uma mísera nota 6). A nota mais alta foi 7 para a legislação nacional sobre o uso do capacete.
O Brasil está no grupo 1, entre os 90 países com mais registros de mortes de trânsito no mundo.
O relatório global da ONU divulgado em 2013 apresenta dados oficiais de 2010 em que registra que somos donos de uma frota de 43.632.236 carros e veículos leves de 4 rodas; 16.508.854 motorizados de 2 e 3 rodas; 3.954.202 caminhões pesados e 722.682 ônibus. Considerando que tais dados tem 4 anos de atraso e do jeito que compra-se e vende-se carros no Brasil, sem dúvida que a frota é muito maior.
No Brasil morrem em acidentes de trânsito 22 pessoas a cada 100 mil habitantes (a média mundial é 18 a cada 100 mil habitantes) e nosso compromisso até 2020 é de reduzir a acidentalidade e os óbitos a 11 mortes a cada 100 mil habitantes. Talvez se não morresse mais ninguém no trânsito brasileiro até 2020, quem sabe....
Por outro lado, se fizermos a conta “pelo baixo” considerando 40 mil mortes/ano em acidentes no Brasil, chegaremos a 2020 com 300 mil mortos a mais sem conseguir atingir a meta.
Some-se a isso uma projeção global de chegarmos ao final da Década saltando de 1,3 milhões de mortos em acidentes no mundo para 1,9 milhões.
E se não conseguirmos cumprir com o objetivo assumido perante a ONU e o mundo de reduzir a acidentalidade para 11 a cada 100 mil habitantes, o que acontecerá ao Brasil? Sofreremos restrições de qualquer ordem? Perderemos o direito a concessão de empréstimos ou coisa que o valha?
A resposta é não! A punição será moral mesmo diante da vergonha e da fragilidade de não conseguirmos controlar e frear tantas mortes no trânsito. Isso porque a meta aceita para a Década é um pacto pela redução da acidentalidade e não um compromisso formal assinado pelo Estado brasileiro.
Considerando ainda que grande parte do dinheiro arrecadado com multas de trânsito e que vai para o FUNSET no país fica “retido” para reserva de contingência para saldar outros compromissos do governo em vez de ser aplicado na totalidade em ações pontuais em educação e prevenção de acidentes, o cenário não nos dá um bom prognóstico.
E não me venham falar de pessimismo porque sou uma das pessoas mais otimistas em meio a esse cenário de guerra. Neste exato momento estou mobilizada e em luta com a sociedade organizada de Blumenau para realizar 3 marcos históricos em ações preventivas e educativas para a segurança das pessoas no trânsito e que envolvem, pela primeira vez nos 163 anos de Blumenau, toda a população da cidade de municípios vizinhos.
Falta dinheiro, muitas vezes falta apoio, enfrentamos um caminhão de dificuldades por dia, mas não desistimos de fazer a nossa parte, muitas vezes nos esfalfando para conseguir o pouco que temos para fazermos a nossa parte.
É fato que sozinhos não vamos mudar o cenário e tampouco baixar esses números. Mas, se cada um fizer a sua parte, se começarmos a pensar e agir coletivamente, é certo que esse cenário muda!
Começando pelo governo federal, lá em cima: deixando de reter dinheiro importante e exclusivo para colocarmos em prática o Capítulo VI do CTB em apoio a outras ações para um trânsito seguro; parando de baixar impostos para estimular a venda de carros e beneficiar a indústria automobilística, por exemplo.
Quem sabe se o governo federal parasse com a demagogia das propagandas que associam comprar carro a ideal de felicidade e melhoria da qualidade de vida e começasse a investir na qualidade do transporte coletivo e meios alternativos de transporte as coisas começassem a andar. Se começasse a investir na construção e conservação da malha viária do país, certamente teríamos menos acidentes cujo fator incidente fosse a via.
Porque no Brasil quando precisam arrumar dinheiro para algo que julgam importante, curiosamente aparecem as oportunidades, as leis, os programas disso e daquilo que possibilitam alcançar esses objetivos. Ou será que seremos obrigados a acreditar no inacreditável de que a acidentalidade, as mortes e o exército de feridos e mutilados também dão algum lucro para alguns?
Ou a sociedade brasileira acorda e começa a fazer a sua parte agora mesmo para honrar e proteger a vida das pessoas no trânsito ou continuaremos a assinar pactos e tratados e convenções e tantos outros papéis e a continuar passando vergonha diante do próprio país e do mundo.
Eu estou fazendo a minha parte e não me agrada nada morrer no trânsito como mártir, juntamente com outros abnegados que tem como principal motivo para abrir os olhos cada manhã a preservação da vida das pessoas no trânsito. Acorda, meu país!
Fonte:
Boa tarde! Sou Capitão da Polícia Militar de Minas Gerais e comando uma Unidade com 80 militares do trânsito rodoviário, em 55 municípios do Sul de Minas, em 1568 Km de malha viária. Admiro suas postagens. Pensei na sugestão de se criar um Programa, aos moldes do PROERD (se é quevc conhece) contemplando conteúdo exclusivo de trânsito para crianças do do 5º e 7º anos. O que acha?
ResponderExcluiratt
Cap Abdala